Adalberto Guimarães Menezes
Associado efetivo do IHGMG – Cad. 72
Alferes Joaquim José da Silva Xavier
Minas Gerais é um estado privilegiado, por ter sido cenário do primeiro movimento cívico – político – militar que se formou para concretizar o sonho de liberdade que nutria o sentimento nativista latente em todos os brasileiros, e também naqueles que, nascidos no exterior, para o Brasil vieram e o entronizaram em seus corações.
Privilegiadas também são as Minas Gerais, por possuírem encravado em seu território, um pequeno torrão denominado Fazenda do Pombal, situado no Campo das Vertentes, banhado pelo Rio das Mortes, onde nasceu o Patrono Cívico da Nação Brasileira, que eu chamo de Berço da Pátria, e o historiador Fábio Nelson Guimarães de Belém Cívica do Brasil.
Joaquim José da Silva Xavier, futuro Alferes e Tiradentes, era o quarto filho do casal Domingos da Silva dos Santos e Antonia da Encarnação Xavier, proprietários da Fazenda do Pombal, onde nasceu. As ruínas agora existentes, do engenho, da senzala e de muros, atestam a robustez das construções em blocos de pedra e, consoante a representação social do proprietário e a religiosidade própria daqueles tempos, havia uma capela. Documentos mostram o curioso fato de ela ter dois oragos, São Sebastião e Nossa Senhora d‘Ajuda.
O tempo correu, as atividades econômicas mudaram, novos titulares daquelas terras se sucederam e aquelas construções e benfeitorias foram perdendo funcionalidade e interesse. As instalações ficaram abandonadas, se deterioraram pela ação do tempo e destruídas pelo homem, com a remoção para emprego, em outros lugares, de telhas, madeiras e pedras.
Em 188 o Bispo de Mariana, D. Benevides, autorizou a demolição da ermida de N. Sra. d’ Ajuda. Em 1884, o Coronel Emydgio de Mendonça adquiriu a fazenda Ouro Fino – a primitiva Fazenda do Pombal era muito extensa, foi dividida em várias outras, e a Ouro Fino uma delas, a que ficou com as construções – e, para aplicar na sua sede, distante 3 km, demoliu o que restava das edificações, e também a capela, que ainda estava em relativo bom estado porque, como templo que era, fora protegida por um escudo formado pela religiosidade da população, evitando depredações e saques. O altar, portais, imagens, sino e tudo que ela continha foram guardados em um cômodo da fazenda. Devemos ser gratos ao Cel Emydgio pelo seu zelo.
A Fazenda Ouro Fino passou por vários proprietários, e nenhum deles teve a preocupação de preservar o “Berço da Pátria”, até porque possivelmente não sabiam quem fora Tiradentes; se sabiam, desconheciam que ele ali nascera. Há de se acrescentar que Tiradentes era considerado um traidor do Rei, um rebelde.
Quando, na década de 1930, um pequeno grupo de historiadores, brilhantemente liderado por Augusto de Lima Júnior, então Chefe de Gabinete do Dr. Gustavo Capanema, Ministro da Educação, conseguiu sensibilizar o Presidente Getúlio Vargas, que, entre outros atos importantes, declarou a Fazenda do Pombal objeto de desapropriação e tombamento no Dec. Lei n° 25, de 30-11-37, dando-lhe o número 433 como sendo de inscrição para futura concretização do previsto no decreto-lei.
A Fazenda do Pombal, quando o Alferes nasceu, pertencia ao Termo de São João del Rei, depois a São José del Rei (hoje Tiradentes), e hoje o torrão sacro – cívico integra o Município de Ritápolis.
Ainda na sequência da intenção manifestada pelo Governo Vargas, em 1948 o Ministério da Agricultura adquiriu-a por compra de Geraldo Andrade de Resende, já então com a área de apenas 89,50 ha, distribuídos em torno das ruínas centenárias, como se quisesse protegê-las. Era administrada pelo IBDF (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal), que ali instalou uma EFLEX (Estação Florestal de Experimentação de Ritápolis). Ao IBDF sucedeu o IBAMA, que por sua vez o foi pela FLONA (Floresta Nacional Ritápolis), e o é pelo Instituto Chico Mendes. O Diretor, Engenheiro Florestal José Nivaldo de Menezes Machado, que esteve na função mais de vinte anos, contou-me que quando chegou não havia qualquer vigilância, e não havia um só funcionário, e seu escritório era na área urbana de São João; que até de caminhão iam pessoas da região arrancar e levar para si os blocos de pedra das construções, sendo obrigado a mais de uma vez solicitar a intervenção policial para coibir a depredação e roubo de material; que muitas vezes, preocupado, chegou a dormir no local; com muita dificuldade conseguiu recursos para construir alguns imóveis para sua administração e a nomeação de funcionários; alguns deles hoje (2002) residem na Fazenda e colaboram na sua segurança.
O objetivo colimado pelo já referido Dec. Lei n°25, de 1937, foi finalmente alcançado em 21-09-71, quando o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) de acordo com o Processo n°832-70, e n° de inscrição 433, de 1937, efetivou o tombamento da Fazenda do Pombal.Infelizmente, esta medida não trouxe nenhuma providência visando à incolumidade daquelas ruínas, e não fora o interesse dos administradores daquele sítio histórico. Não fosse Nivaldo Machado e outros que os antecederam, todos do quadro do Ministério da Agricultura ou dos ministérios em que se desdobrou, talvez nem mesmo as ruínas existissem mais.
Daquele sacro-cívico solo, sempre com realização de solenidade, foram retiradas porções e enviadas a Ponta Grossa – PR, para ser colocada na base de um monumento que aquela comuna erigira em homenagem ao Patrono Cívico da Nação; para a Diretoria da Liga de Defesa Nacional sediada em Porto Alegre – RS; para o México, atendendo a uma solicitação feita por via diplomática, para figurar nas festividades comemorativas do Ano de Juarez, que também morreu pela liberdade de sua pátria. Outra emocionante prova de reconhecimento da grande importância da Fazenda do Pombal em nossa história é que nela foi plantado um pé de pau-brasil, e em cuja cova foram colocadas porções de terras extraídas do solo de todos os estados brasileiros.
Na primeira década desta centúria mantive uma agradável conversa com o saudoso Monsenhor Sebastião Raimundo de Paiva, admirável promotor do sentimento religioso da cidade de São João del-Rei e cioso guardião do patrimônio sacro-artístico da cidade, Pároco da Catedral de N. Sra. do Pilar e Curador do Museu de Arte Sacra da mesma cidade. Contou-me que o acervo artístico-religioso-histórico da Fazenda do Pombal, que estava em poder de familiares do falecido Sr. Francisco Resende, foi colocado à venda havia algumas décadas pela senhora D. Julieta Resende Coelho. Pretendeu ele, na ocasião, adquiri-lo por meio de doação, tendo pedido a intercessão do Dr. Juscelino Kubitschek, sem sucesso, e uma carta à UNESCO ficou sem resposta. Anos depois conversou sobre o assunto com D. Andréa Neves, que se sensibilizou com a pretensão dele, Monsenhor Paiva, toda ela voltada para o enriquecimento cultural de sua cidade, e prometeu pedir a interferência de seu irmão, Aécio Neves, então deputado federal. O Deputado Aécio Neves também sensibilizado, ainda mais que na ocasião realizavam-se as comemorações que lembravam o bicentenário do sacrifício de Tiradentes, empenhou-se e conseguiu que a Construtora OAS, com grandes obras no Brasil e no exterior, adquirisse o ambicionado acervo e o doasse à Fundação Museu de Arte Sacra de São João del Rei.
Resolveu-se então construir uma capela em uma parte livre do terreno do Museu. Construída, Monsenhor Paiva foi à fazenda e trouxe o trono e o altar. As outras peças já estavam sob sua guarda. As de maior porte, de madeira, tinham sofrido alguns danos, mas já tinham sido restauradas.
A capela estava, janeiro de 2009, em fase final de construção, esperando-se que em breve ela já poderia ser inaugurada, com todas as peças em seus devidos lugares. Tudo estava sendo obrado com o valiosíssimo patrocínio da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais.
A capela da Fazenda do Pombal, testemunha muda da juventude do Alferes Joaquim José da Silva Xavier, está sendo totalmente transplantada para junto da igreja à qual pertencia, e pose ser visitada, graças à OAS, à FIEMG, ao incansável sacerdote Monsenhor Paiva, Sra. Andréa Neves e Dr. Aécio Neves.
Podemos admirar o seguinte: imagens de N. Sra. d Ajuda, N. Sra. do Carmo, São José de Botas e São Francisco, missal, altar, portais, cômoda, trono, sino, castiçais e galhetas.